sábado, 16 de junho de 2018

A bandeira do Assaí

Passo todos os dias por uma rua do Village e de lá vejo a bandeira do Brasil hasteada no estacionamento do hipermercado Assaí.

Por que diabos há uma bandeira hasteada no estacionamento de um hipermercado? É o que penso todos os dias.

Mas me conformo com o mistério sem solução e sigo dirigindo rumo ao trabalho.

*          *          * 

Um dia, isso me doeu. Tudo parecia tão perfeito... Tão rotineiro... A bandeira estava onde e como deveria estar. Eu estava passando por onde sempre passo, indo trabalhar no horário habitual. Dirigindo, apressada, pensando em tudo e vendo a bandeira do Assaí.

Mas havia algo diferente: era o dia seguinte da sua partida inaceitável.

Parei o carro e comecei a digitar no celular. Uma estranheza se apossou de mim. A bandeira estava lá, você não mais estava. Guardei os meus escritos e fui para meus alunos - nem eles nem ninguém desconfiaram do meu coração tão dolorido naquele dia...

Desde então, todos os dias que ali passo, vejo a bandeira de prontidão marcando as horas da normalidade, da vida que segue e a dor volta, como um sufocamento, um aperto no peito, uma incompreensão.

*          *          *

Ontem fez um mês da sua partida. 
Pensando na próxima edição do sarau, de repente o tema Somos Tão Jovens parou no meio da minha garganta: você era tão jovem!

Era jovem como meus filhos são... Era jovem como fui um dia... Você será jovem para sempre...

*          *          *

 A bandeira do Assaí

A bandeira tremula, indiferente.
O céu está de um azul perfeito.
O dia parece imaculado.

A bandeira tremula continuamente.
Há uma suave brisa.

 A bandeira tremula, não importa o que aconteça.

Enquanto houver brisa, a bandeira tremula, inquieta, imponente.

Símbolo da pátria amada.

Mas enquanto a bandeira tremula,
uma jovem está trêmula.

Enquanto a bandeira tremula,
abaixo dela, no estacionamento,
na porta do colégio, na praça, nas ruas
a vida acaba.

Símbolo da pátria armada.

Soraia Macedo
28.08.2000
15.05.2018

(Esse poema não foi escrito pela poeta Klara Rakal, e sim pela pessoa, mãe, professora Karla Antunes, em 16.05.2018).

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