Teu olho tem um brilho
De sol refletido
— São olhos de mil sóis!
E os meus olhos sós
Procuram os teus
Que, no entanto,
Só me dão adeus...
Poema
do livro
Rastro
de Salamandra,
VillarLuna, 2017.
Escrito
na minha mocidade
ANTES QUE EU ME ESQUEÇA...
Muitos anos se passaram, mas aquela cena exata, enquadrada pelo meu sentimento, nunca esqueci. O moço estava de pé, todo vestido de branco (era graduando de odontologia), e estávamos rompendo o namoro.
No meu peito, um aperto, pois eu era muito apaixonada por ele... havia uma tristeza no ar, de ambas as partes. Naquele dia, não houve discussão. Só um sentimento de... nem sei dizer. Vida em suspenso, indefinição... solidão.
Eu estava sentada no degrauzinho do portão de casa, na rua Haia, então tinha um ângulo de visão peculiar. Quando, de repente, um raio de sol, desses fugidio, alcançou bem os seus olhos castanhos, fazendo-os quase ficar cor de mel... havia, sim, doçura naquele olhar, mas também uma frieza, difícil explicar, só a poesia talvez consiga se aproximar do que vi e senti naquele momento.
Entrei e, em vez de chorar, escrevi... sim, chorei depois. Mas registrei em palavras o que daquele dia mais ficou tatuado na minha memória.
Depois reatamos, casamos, tivemos filhos e... muita coisa aconteceu nas nossas vidas, boas e más. Nos divorciamos, a vida deu tantas voltas, mas nós não nos reencontramos mais. Nem amizade ficou, só mágoas...
Chorei muitas vezes mais, tantas, que desconfio quase secaram minhas lágrimas. Hoje, é muito difícil eu chorar.
*A foto traz um olho feminino, mas não importa: foi a imagem mais aproximada que encontrei daquele olho "de mil sóis"...
O amargor se espelha em muitos fragmentos de lembranças que esquecemos. O que não se consegue pensar, conversar, ouvir outras experiências, com medo da exposição dos sentimentos, mais tarde o preço será alto para ver envelhecida, a maturidade que se tem.
ResponderExcluirAgradeço o comentário tão bem redigido. Mas não vi relação com o poema em questão. Em mim, do episódio relatado, ficou mesmo foi a poesia do reflexo do sol que na época transmutei em versos. Hoje, na minha maturidade, fica a gratidão por tudo que vivenciei e me construiu no que hoje sou. Nenhum amargor.
Excluir